segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Arquitéctura Tumular em Portugal

Na Europa e como reflexo da nova ideologia nascida da Revolução Francesa e das suas preocupações higienistas, os sepultamentos deixam de se realizar nas igrejas e passam a fazer-se em área aberta próximo das povoações.
Embora já existindo no país algumas comunidades estrangeiras que praticavam a inumação a céu aberto, nomeadamente grupos protestantes, judeus e asiáticos, em Portugal só se poderá falar da existência de cemitérios públicos após a legislação publicada em 1835, a qual vai regulamentar a colocação dos novos cemitérios ao cuidado das autarquias assim como cria a necessária legislação para o efeito.
A construção destes equipamentos nem sempre foi pacífica e homogénea. Nos meios urbanos a sua aceitação ocorre de uma forma natural ao invés do interior, no qual varias forças de bloqueio, sociais, culturais e mesmo politicas, mais ou menos organizadas, após a Reforma da Saúde Pública de Costa Cabral em 1844, debandam em contestação social, nomeadamente na Revolta da Maria da Fonte e na consequente Guerra Civil da Patuleia (1846/47).
Gradualmente, com a sobrelotação dos antigos cemitérios, a diminuição dos enterramentos religiosos face aos civis e à crescente procura destes novos cemitérios públicos pelas elites estes adquirem importante estatuto. Estas elites vão reconhece-los como local propicio à reafirmação do seu status tornando-os em verdadeiras montras do seu poder.
Só no séc. XIX se criam os cemitérios como os conhecemos hoje sendo esta a época de maior investimento em termos artísticos, correspondendo tal época áurea ao romantismo. Embora as posses dos encomendadores fossem grandes condicionantes, a tumulação condigna torna-se numa obrigação social, pelo que é sobretudo para o romantismo que os cemitérios se revestem de uma maior importância histórico-artistica.
Uma das formas de expressar o prestígio social vai ser a construção de jazigos em forma de capela. O neoclássico, gosto dominante na própria arquitectura civil de oitocentos, surge nas construções tumulares, em Portugal, na década de 1840. Surge também o neogótico. A transição entre ambos é tão subtil e relativamente rápida que é quase imperceptível. A sua adopção é gradual e nos primeiros tempos coabita com elementos ainda neoclássicos.
Os primeiros vestígios de um neogótico incipiente surgem ainda na década de 40, em capelas classicizantes mas já com a adopção de molduras em arco quebrado, nas portas. Mais tarde é já visível um neogótico mais evidente através do verticalismo das construções.
Além, da construção dos jazigos em capela, vão ser também bastante utilizados os jazigos em forma de obelisco – uma das formas da antiguidade clássica mais massivamente recuperada pela arte cemiterial oitocentista, em especial aplicada a pequenos mausoléus. Pela sua fisionomia é propenso, quer ao memorial, quer à evocação da própria simbologia da morte.
A partir da década de 80 o neogótico começa a dominar toda a linguagem fúnebre do norte alastrando-se gradualmente até ao sul do país, passando então a ser uma estética quase obrigatória.
Com o passar do tempo e com a cada vez mais generalizada construção de monumentos, o neogótico vai perdendo originalidade, passando a ser uma linguagem repetitiva e cada vez mais depurada, mantendo as suas formas básicas e perdendo os decorativismos simbólicos próprios da tipologia. Tendo entretanto o gosto popular prolongado-o pelo séc. XX, quer devido à sua redescoberta pelo romantismo, quer pelos conhecimentos simbólicos e formais dos próprios artesões.
A partir da segunda metade do séc. XX ocorre uma drástica mudança nas formas e tipologias dos jazigos. Tornam-se mais lineares e simplicistas, dentro das novas linhas arquitecturais, de influência civil, vigentes na altura. Vão reflectir os novos padrões arquitectónicos resultantes do “confronto” entre a arquitectura moderna dos primeiros anos do séc. XX e da arquitectura propagandística do Estado Novo. Vão ser o resultado de uma gradual perda das técnicas construtivas e decorativas do começo do século, assim como vão reflectir uma nova sociedade, mais democratizada economicamente em que a construção de jazigos já não é um privilégio das elites mas agora acessível a um maior número de pessoas.
Perdem-se os “artificialismos” decorativos e ganham-se novos nichos de mercado ao se restringir ao mínimo as modernas construções tumulares. Um dos principais aspectos de interesse pelos cemitérios antigos é a escultura e, sobretudo no mundo anglo-saxónico, a antropologia e a genealogia. Nos países latinos a arquitectura é mais valorizada, permitindo a sua análise, à semelhança da das cidades, aperceber a evolução histórica, artística e social da própria sociedade.
Toino/09

Sem comentários:

Enviar um comentário